(1884) C. FRANCK Prelúdio, coral e fuga

Prélude, choral, et fugue — pour piano

Compositor: César Franck
Número de catálogo: M 21
Data da composição: 1884
Estréia: 24 de janeiro de 1885 — Paris, Salle Pleyel, Marie Poitevin ao piano

Duração: entre 15 e 20 minutos
Efetivo: piano

César Franck foi um grande organista, e por isso um grande estudioso e admirador da obra de J. S. Bach (gosto que naquele tempo era restrito aos conhecedores). À época da composição, Franck vinha se interessando mais e mais pelas obras tardias de Beethoven (morto mais de meio século antes) e estava influenciado — como todos, aliás — pela sonoridade wagneriana (Wagner morto um ano antes, em 1883). Some-se a esse poderoso tripé musical — Bach, Beethoven e Wagner — a figura de uma pianista prodigiosa, Marie Poitevin, aluna de Franck no Conservatório de Paris e futuramente a responsável pela première da obra.

Mademoiselle Poitevin vinha mostrando a seus professores, Franck inclusive, as obras de seu amigo Emmanuel Chabrier. Isso motivou Franck fortemente a pedir que seus discípulos criassem mais obras francesas, para dar corpo a um repertório francês de piano, e foi dessa motivação que veio a centelha que desdobrou-se na realização desta composição.

São, como o nome já desvenda, 3 partes, encadeadas e sem intervalo entre elas: 

Prélude: Moderato
(Prelúdio: Moderadamente) — cerca de 4 minutos 
O Prelúdio liga-se à tradição de Bach naqueles prelúdios que antecediam suas geniais fugas, mas tem muito mais de Chopin (que em seus Préludes foi livre e poético) e — porque não dizer? — de Beethoven.

Choral: Poco più lento
(Coral: Um pouco mais devagar) — cerca de 5 minutos
Bach é, outra vez, referência, nos seus "chorales" feitos para o órgão, que mimetizava o canto congregacional da Igreja Protestante. Aqui o piano é o veículo e Franck tira partido da beleza dos arpejos para construir um motivo coral de grande força e efeito, o tema mais memorável de toda a peça. Segundo Vincent d'Indy, pupilo de Franck nesse tempo, o plano inicial era escrever apenas um Prelúdio e Fuga nos moldes bachianos, mas a idéia de um coral — natural, talvez, para um organista — que servisse de ligação foi tomando força e esse trecho acabou sendo o coração da obra.

Fugue: Tempo I
(Fuga: Volta ao tempo inicial) — cerca de 9 minutos
Uma fuga meticulosa, que revisita os temas tanto do Prelúdio como do Coral, e desenvolve-se de forma magistral, quase sinfônica. Talvez seja aqui mais evidente a sombra de Wagner, de cuja obra temos aqui um eco distante do Parsifal, e a escrita pianística remete até mesmo ao grande Liszt, pela robustez e polifonia.

O colega Camille Saint-Saëns, em ácido comentário, declarou que "o coral não é um coral, e a fuga não é uma fuga", o que tecnicamente poderia até estar certo, mas este não é um trecho musical de um almanaque genérico, e sim a figura simbólica de cada uma dessas partes, trazidas à luz depois de serem negligenciadas desde Bach e Mendelssohn (o único outro compositor entre Bach e Franck a interessar-se pela esquemática prelúdio-fuga).

© RAFAEL FONSECA