(1905) MAHLER Sinfonia n. 7

Lied der Nacht (Canção da Noite) — título apócrifo que por vezes aparece, mas foi rejeitado pelo compositor

Compositor: Gustav Mahler
Número de catálogo: MW 7
Data da composição: 1904 a 15 de agosto de 1905
Estréia: 19 de setembro de 1908 — Em Praga, com a Filarmônica Tcheca regida por Mahler

Das Sinfonias de Mahler, sem dúvidas a Sétima é a mais árida, de assimilação mais difícil, por abrigar 5 movimentos que dão a impressão de que pouco se intercomunicam. Há temáticas pouco consistentes e um desentrosamento que remete, talvez, a tudo o que Mahler iria viver entre o término dessa partitura e sua estréia em Praga, os 3 golpes de martelo que no final da Sexta se materializariam, implacavelmente, em 3 duros golpes do destino: em 1907 Mahler perde o cargo de diretor da ópera de Viena tendo contra si toda a comunidade musical; sua filha Maria morre com 4 anos e ao mesmo tempo ele descobre uma doença cardíaca incurável. A alegria algo artificial, imposta, frívola e sem consistência que a Sinfonia carrega pode ser a tradução da apreensão daquele que pressente que logo será destroçado. Se admitirmos a Sexta como o presságio da desgraça por vir (na vida do compositor), a Sétima será então a tentativa de escapar, de forjar um otimismo desejado mas inalcançável.

A estrutura é Allegro — Nachtmusik — Scherzo — Nachtmusik — Allegro. Os dois grandes Allegro externos são os movimentos mais problemáticos, um soturno e o outro forçadamente feliz; as Músicas Noturnas (Nachtmusik) são peças de grande encantamento; e o Scherzo central traz algo de demoníaco. Nas marcações de andamento, Mahler mistura alemão e italiano:

I. Langsam — Allegro risoluto, ma non troppo
(Lentamente — Rápido decididamente, mas sem ser demais)
Na introdução lenta o chamado desconcertante e belo de um bombardino — ou eufônio, instrumento de metal raro em formações orquestrais e mais encontrado em bandas — dá o tom melancólico que irá impor-se na marcha inquieta do Allegro, que por vezes toma ares fantasmagóricos entremeando-se a episódios de agitação frenética e angustiada.

II. Nachtmusik I: Allegro moderato
(Primeira Música noturna: Rápido moderado)
A primeira música "noturna" (termo inspirado na famosa Serenata "Noturna" de Mozart) é escura, e evidentemente evoca a noite, mas há algo de sombrio e perturbador. O mestro holandês Willem Mengelberg, amigo de Mahler, contava que esse movimento era a tradução musical do quadro "Ronda Noturna" de Rembrandt

III. Scherzo: Schattenhaft. Fließend aber nicht zu schnell 
(Scherzo: Sombrio, fluindo mas não muito rápido)
Se "scherzando" quer dizer brincando, esta brincadeira tem lugar num pesadelo. Sim, há o clima sarcástico esperado num Scherzo, mas é um esgar debochado muito além do esperado. Trata-se da valsa vienense tratada com máxima ironia, a beleza transformando-se em grotesco, sopros e metais emitindo gritos e uivos inéditos.

IV. Nachtmusik II: Andante amoroso
(Segunda Música noturna: A passo de caminhada, amorosamente)
O ponto alto da Sinfonia, um movimento encantador, mas que não deixa de ter seus momentos sombrios. Na segunda música noturna, poesia e delicadeza se encontram, e um solo de bandolim traz um sabor todo especial, como uma Serenata à janela de Julieta. A música nos conduz noite adentro, e no final vai se dissolvendo, como a escuridão perde-se na luz que virá no próximo — e último — movimento.

V. Rondò-Finale: Allegro ordinario
(Final em forma de Rondò: Rápido, normalmente)
Explode a luz, após a passagem da noite... Seria essa a intenção? A música aqui toma um caráter absolutamente triunfante, mas há banalidades em excesso. Talvez Mahler quisesse e tenha desejado esse aspecto naïve para provocar o ouvinte, já que absolutamente nada em sua obra é gratuito e ao acaso, e este movimento não pode ser encarado como "a pior coisa de Mahler" como muitos críticos já ousaram dizer. Há citações — na verdade, imitações ácidas — de temas da ópera "As Alegres Comadres"de Franz Lehár, dos "Mestres Cantores" de Wagner, e até da Quinta Sinfonia dele mesmo. Transbordando sarcasmo, tudo caminha para uma conclusão exuberante e algo histérica. Eu a ouço como a gargalhada nervosa do apavorado. 

© RAFAEL FONSECA